terça-feira, 5 de outubro de 2010

O nada

Escrevo sobre  tudo que há no nada
        sobre a folha que rola na estrada
no vão da escada
        no vinho que sobra na taça
no relógio da rua que atrasa
        no cão sem dono na praça
na poça que há na calçada

Tudo que parece inútil
                      me abraça
é minha sina
          me enlaça



sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Liquefazendo-me

A água é que me invadia, entrava pelos meus olhos,  pelos poros,  me fazia líquida. Lavava a minha  casa, inundava  a minha vida. As paredes, aos poucos, se cobriam de mofo e tudo ia se deteriorando, saturado de umidade. O pensamento se diluia lentamente, pondo a alma confusa,  num emaranhado de musgos. Os fungos  se reproduziam em tudo, alimentados pelos minúsculos fragmentos decompostos pelo tempo.  E eu já era quase um líquen, um vegetal sobrevivendo, apenas. Nessa forma, conseguia viver nos lugares mais inóspitos, me agarrando em rochas e até em cascas de árvores. A decadência tomava conta do mundo, à minha volta. Era o desfazer-se total.  O bolor se instalando. A ruína iminente.