sábado, 24 de outubro de 2009

Dançando em algum céu


O luar era tão claro e presente,
que quase se pegava
com a mão.
Então, do fundo do peito  nessas noites,
subiam sentimentos vagos, estranhos.
Um perfume de açucenas ou jasmins,
cantar de grilos, conversas na varanda.
Coisas antigas, distantes.

De repente, no jardim, podia acontecer
um lago, uma floresta, cachoeiras, duendes de papel,
bailarinas de algodão...
Um desabar de mistérios.

Hoje  tudo fica suspenso
no silêncio, esperando pelo nada.


terça-feira, 20 de outubro de 2009

João dos Sertões Guimarães Rosa




No dia 22 de novembro de 1967,
Carlos Drummond de Andrade  publicou no  Correio da Manhã, um poema para  João Guimarães Rosa. Fazia três dias que
o escritor  havia morrido.

Transcrevo aqui, algumas linhas desse poema.


Um chamado João

"João era fabulista?
fabuloso?
fábula?

Um estranho chamado João
para disfarçar, para  farçar
o que não ousamos compreender?

Tinha pastos, buritis plantados
no apartamento?
no peito?
Vegetal ele era ou passarinho
sob a robusta ossatura com pinta
de boi risonho?

João era tudo?
tudo escondido, florindo
como flor é flor, mesmo não semeada?

Guardava rios no bolso

E de cada gota redigia
nome, curva, fim
e no destinado geral.
Embaixador do reino
que há por trás dos reinos,
dos poderes, das
supostas fórmulas
do abracadabra, sésamo?

Ficamos sem saber o que era João
E se João existiu
de se pegar."


segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Sertão particular

 Fotografia da web

 
Inspirada em Guimarães Rosa, que trazia 
  sertões dentro de si.




Eu também trago sertões  dentro da alma. São os meus sertões particulares. Sei que você trazia os seus, Guimarães Rosa,  na massa do sangue.
São nossos sertões essenciais! E meu peito  vive encharcado do silêncio desses confins.  A alma,  se quero  encontrá-la, é lá, nessas clareiras abertas do sem fim.  Como nesses dias de chuvarão, de nuvens escuras e céu baixo, sufocante. É ali que eles se escondem, meus fantasmas!  Ali onde o tempo é pesado, denso.

Sonho com campos abertos sob céus azuis e leves. Mas o vapor que se desprende da terra, me traz de volta ao mundo real.  Respirar fica difícil e penoso.  Embota até o pensamento.  O tempo mofa,  disfarçado  embaixo de folhas.  Nesses descampados, úmido,  abafado,  só o esquecimento permanece.

Impossível  lembrar de  deslumbramentos.  Tudo cheira  a dias tristonhos.  Até a beleza, se existe, fica invisível,  encoberta. Esses vazios comem minhas entranhas. Engolem a minha alma.


terça-feira, 13 de outubro de 2009

Inutilidades







Ouvir no parapeito da noite
o silêncio ensurdecedor das madrugadas.

Esperar nos anéis da  lua
uma tarde de amor que não virá

Conhecer a  infinita
solidão dos minerais 

Juntar  fragmentos
de um tempo que já se quebrou

Recuperar em cada amor
a magia do olhar que já passou


quarta-feira, 7 de outubro de 2009

'Está chovendo na roseira'



A minha emoção hoje é o universo!
Quando soube que os telescópios espaciais da Nasa,
haviam feito uma nova e incrível descoberta,
fiz uma viagem interplanetária.
Minha imaginação fez passeios pelo espaço sideral. Mas mesmo com toda
boa vontade, não cheguei nem perto de compreender tal grandiosidade.

Que virtual nada, meus queridos!
A grande viagem hoje, é muito mais longa!
Percurso que só podemos realizar em nossa imaginação.

A novidade é um novo anel em volta do planeta Saturno.
E não se trata de só mais um anel, não. Essa gigantesca 'criatura'
se estende em uma circunferência a seis milhões
de quilômetros do planeta.
Essa distância já me causa angústia.
Ser tão pequena, me enche de sentimentos de insignificância.
E
, dizem os cientistas, dentro dele caberiam aninhados,
um bilhão de planetas iguais ao nosso.

São informações que podemos perfeitamente dispensar.
Hoje, por exemplo, estava pensando em escrever sobre as emoções
que deixo escondidas nas entrelinhas.
E
que podem ser apanhadas e interpretadas de outras formas.
Emoções que deixo livres, sem destino, à deriva,
sem lenço ou documento algum.

Confesso que vivo, a maior parte do tempo, sem nem
pensar nessas 'aberrações'.
Essas informações, mexem com os meus conteúdos.

E precisamos de tão pouco!
O barulho da chuva no telhado, o cheiro da terra molhada,
a água caindo, as florinhas tímidas que surgem encharcadas
nas manhãs, o sabor de um beijo ou um olhar profundo e quente,
é tudo que precisamos lembrar!


..."Precisamos apenas viver - sem nome,
nem número, fortes, doces, distraídos, bons, como
os bois, as mangueiras e o ribeirão."

Trecho de Um sonho de simplicidade, de R. Braga