sexta-feira, 29 de maio de 2009

Ao vento...

Fotografia de Bruno Silva "Abstração do Silêncio"












Escrever
o suficiente 

Melhor
ser só reticente

Só suspirar
não falar

E enterrar a alma
no duro chão
do silêncio

segunda-feira, 25 de maio de 2009

A felicidade é como a pluma...não consegue pousar

"Junto à minha rua havia um bosque
Que um muro alto proibia
Lá todo balão caía
Toda maçã nascia
E o dono do bosque nem via..."

Chico Buarque


Sonhava, quando menina,
com mundos mágicos,
onde ser feliz era uma lei!
E os sonhos brotavam do chão
como morangos maduros, prontos para serem colhidos!

Tudo era tão possível e tão ao alcance das mãos, que
bastava respirar fundo para que a felicidade surgisse
e inundasse a vida, iluminasse todos os desejos!
Com o tempo fui aprendendo sobre as ilusões.
Nada sabia delas. foi um longo aprendizado.
Aos poucos e tristemente, fui compreendendo
que não bastava querer loucamente,
era preciso fazer acontecer.

Descobri que não possuia 'super poderes'!
A vida tinha de querer junto comigo.
Mas ela quase nunca queria no mesmo momento.

Muito depois, ela trazia, numa bandeja enfeitada
de flores e perfumada, o meu desejo antigo e tão
ardentemente esperado!

Muito tarde... e a vida, descobria eu, nunca é boazinha.
Ela é uma moça cheia de caprichos e 'birras'.
Ela se dá, mas só depois de percorrer muitos caminhos.
Depois de se esconder e se fazer de sonsa e se valer de
subterfúgios e nos dizer 'talvez', muitos 'talvez'!
Estranha e 'manhosa'. Evasiva, cheia de ardis.
Dissimulada é a vida!

E quando percebe que enfim desistimos, vem correndo
com o nosso sonho e o joga em nosso caminho.

Mas já é outro instante, outro sonho, outro desejo!
Então, muito desapontados, tomamos aquilo
que perseguimos há um tempo atrás, com tanto
interesse e paixão, e não sabemos o que fazer com ele,
onde o colocamos.

E como um inútil e desbotado objeto, o levamos para
a nossa imensa galeria de encontrados e perdidos.
O depositamos com cuidado, em uma prateleira, e
lá o deixamos para sempre!

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Quem segura (sem medo) a emoção




"Quem acorda de madrugada e estremece
de desgosto ao lembrar que
há muitos anos feriu a quem amava

Quem se detém no caminho para
ver melhor a flor silvestre
e procura na cidade os traços da
cidade que passou
Quem se lembra todos os dias do amigo mortoQuem entra em delicado transe diante
dos velhos troncos, dos musgos e dos líquens
Quem procura decifrar no desenho da madeira
o hieróglifo da existência...
Todos eles são presidiários da ternura e andarão
por toda a parte acorrentados, atados aos
pequenos amores da armadilha terrestre."

Paulo Mendes Campos
Um véu de água
me escorre na lembrança

Sou um mural
de imagens e vozes

mergulhadas na umidade
do temporefletidas na transparência
das pedras

Transmudo tudo:

Sinto a doçura no mar
 e amargo gosto no mel
 

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Lulih

Essa é uma carta de Lulih! Uma pequena e singela carta!
Mas ela escreve com o coração grande que tem, que adivinho!
Porque só conheço Lulih de lê-la!
E tudo é sempre de uma leveza e beleza que me tocam!
E hoje 'roubei' um texto dela para ficar para sempre no meu blog!
Lulih, obrigada por você se parecer tanto com quem a imagino!!

"Deus, não espero que a esta carta o senhor responda formalmente, já que não me respondeu a tantas outras. Mas espero por um sinal. Se o senhor se aborrecer, pode responder com um temporal que arranque as telhas da minha casa, por exemplo. Antes assim do que me deixar pensando que para o senhor eu sou apenas uma bolha n´água.
Estou lhe escrevendo para dizer que acho que o senhor dorme, sim. Ao contrário do que dizem os pára-choques dos caminhões, que Deus não dorme. E acho inclusive que o senhor anda dormindo de touca, perdendo a boca e fugindo da briga, senão como é possível explicar essa vida tão torta?

Eu sou um cara simples, que até pra escrever precisa da ajuda dos poetas, de quem vive tomando versos por empréstimo. E pra não parecer leviano poderia enumerar razões para a
certeza de que o senhor dorme, mas esta é tão grave que deve ser suficiente... olha: João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém.
Percebe o tamanho do desencontro? É a maior das catástrofes humanas. Se Lúcifer tivesse vencido a revolução contra o senhor, talvez tivesse administrado as coisas de modo mais simples: João, Teresa, Raimundo, Maria, Joaquim e Lili se amariam uns aos outros, e viveriam em recíproca e constante entrega de seus corpos e almas, sem que isso representasse uma vergonha. E seriam todos felizes. Não vamos nos enganar.... Lúcifer é um libertário!.
Eu não queria parecer vago nem obtuso, mas o mundo sob o seu comando anda muito paradoxal. Em quem eu devo acreditar enquanto o senhor dorme? No sujeito que disse que existe muito mais inferno entre o céu e a filosofia do que possa supor meu vão mistério? Em que eu devo pensar enquanto espero providências: no poder de olfação dos gnus? Na migração sazonal das borboletas amarelas?
Lili continua sem amar ninguém, e eu me despeço sem pedir desculpas, porque não sou do tipo que morre de medo quando o pau quebra, embora haja quem diga que eu não sei de nada e que eu não sou de nada. Assino embaixo tudo o que disse. As outras dúvidas que possuo ficam para a próxima carta, que o senhor poderá ler quando acordar. Se..."
Do blog 'Ave, Palavra!' de Lulih Rojanski
http://www.blogluli.blogspot.com/

segunda-feira, 11 de maio de 2009

(Re) visitações

Gustav Klimt
 
Escrever pode não me levar
pra longe,
mas me leva
no fundo de mim mesma.
Vou encontrando
multidões
pelo caminho.
É um alarido de vozes
e de sons
e as palavras se agarram
nas rugosidades
de muros e paredes.
E escorre a poesia,
ferida pela emoção do momento.
Escrever é necessário e doloroso!

sábado, 9 de maio de 2009

Na confusão das estações

Fotografia da web

verões dentro da alma
que acordo um furacão
a revirar-me por dentro
  invernos  tardios em mim
outonos  hostis e silenciosos
primaveras  frias e sombrias
Eu surpreendo sempre as estações
Vivo um eterno me cobrir de folhas
e perdê-las
Mas são os sonhos que amadurecem agora
Chove e há um murmúrio um lamento de folhas que caem
é  outono   lá fora
Os dias o vento é que leva
A alegria já não senta nas calçadas
Mas a claridade das manhãs insiste em rondar minhas vidraças
Acordo com o canto alegre de cigarras
Vou fazer de conta que amores e flores
não se foram como pássaros assustados
E porque ainda há folhas nascendo
e o desencanto eu tranquei em meu porão
vou fechar a minha porta pra não entrar a solidão

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Para um amigo

Fotografia de Pierre Verger


"Eu sei de animais que vivem em lugares anti-higiênicos, quase privados de ar e de luz. Já vi várias vezes esses estranhos animais. São magros e tristes e se parecem extraordinariamente com os homens. Vivem em cortiços e porões, em casebres infectos e em casarões imundos. Esses animais, que fisicamente, são extremamente parecidos com os homens, são muitas vezes utilizados em serviço quando fracos ou enfermos.



Muitos com mais de cinquenta anos, tuberculosos e exaustos, diariamente são obrigados a trabalhar, se não quiserem morrer de fome. E até animais ainda de tenra idade se vêem obrigados a suportar rudes tarefas. Todos esses animais, se acaso se rebelam contra a sua sorte, são transportados para jaulas mais infectas que qualquer outras. E quase sempre sofrem espancamento e toda espécie de maus tratos.



Desde o nascimento até a morte, eles sofrem todo tipo de misérias e tristezas. Têm de trabalhar durante a vida toda. Com esse trabalho, esses animais enriquecem os homens e fazem prosperar os Estados que os exploram. Creio que não há, hoje em dia, nenhuma espécie animal tão estupidamente explorada como essa.



É interessante notar que, devido a certas semelhanças, algumas pessoas pensam que esses animais são também homens. É engano. Eles de fato, têm alguma parecença com os homens; mas não são homens, são operários."



Rubem Braga escreveu esse texto em São Paulo, em agosto de 1934, em resposta a um decreto do Sr. Getúlio Vargas, cujo artigo dizia: " Fica passível de multa ou prisão quem mantiver animais em cativeiro ou lugares anti-higiênicos ou privá-los de ar ou luz; e abandonar animal doente ou ferido. E esse mesmo artigo dizia que os animais seriam assistidos em juízo pelos representantes do Ministério Público.