sexta-feira, 1 de maio de 2009

Para um amigo

Fotografia de Pierre Verger


"Eu sei de animais que vivem em lugares anti-higiênicos, quase privados de ar e de luz. Já vi várias vezes esses estranhos animais. São magros e tristes e se parecem extraordinariamente com os homens. Vivem em cortiços e porões, em casebres infectos e em casarões imundos. Esses animais, que fisicamente, são extremamente parecidos com os homens, são muitas vezes utilizados em serviço quando fracos ou enfermos.



Muitos com mais de cinquenta anos, tuberculosos e exaustos, diariamente são obrigados a trabalhar, se não quiserem morrer de fome. E até animais ainda de tenra idade se vêem obrigados a suportar rudes tarefas. Todos esses animais, se acaso se rebelam contra a sua sorte, são transportados para jaulas mais infectas que qualquer outras. E quase sempre sofrem espancamento e toda espécie de maus tratos.



Desde o nascimento até a morte, eles sofrem todo tipo de misérias e tristezas. Têm de trabalhar durante a vida toda. Com esse trabalho, esses animais enriquecem os homens e fazem prosperar os Estados que os exploram. Creio que não há, hoje em dia, nenhuma espécie animal tão estupidamente explorada como essa.



É interessante notar que, devido a certas semelhanças, algumas pessoas pensam que esses animais são também homens. É engano. Eles de fato, têm alguma parecença com os homens; mas não são homens, são operários."



Rubem Braga escreveu esse texto em São Paulo, em agosto de 1934, em resposta a um decreto do Sr. Getúlio Vargas, cujo artigo dizia: " Fica passível de multa ou prisão quem mantiver animais em cativeiro ou lugares anti-higiênicos ou privá-los de ar ou luz; e abandonar animal doente ou ferido. E esse mesmo artigo dizia que os animais seriam assistidos em juízo pelos representantes do Ministério Público.

2 comentários:

  1. Rubem Braga é maravilhoso. Punha o coração em tudo o que escrevia. Belíssimo texto.
    Beijos e bom domingo. Que haja uma chuva espiando da janela pra dentro do seu quarto...

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  2. Lulih, gosto da chuva e seu lamento e
    tudo que eu quero, é ela espiando para
    dentro do meu quarto, neste domingo!

    Rubem Braga sempre foi minha paixão!
    Que bom que vc gostou!

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